Ex-presidente do Uruguai, morre aos 89 anos

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 Mandatário uruguaio lutava desde 2024 contra um câncer no esfôfago que se espalhou para o resto do corpo; em janeiro, ele optou por não fazer mais tratamento

A voz de uma das principais lideranças políticas da América Latina se calou. O ex-presidente do Uruguai José “Pepe” Mujica, morreu nesta terça-feira (13) aos 89 anos. A informação foi confirmada pelo presidente uruguaio e seu apadrinhado político, Yamandú Orsi.
Mujica lutava desde abril de 2024 contra um câncer no esôfago que se espalhou para o resto do corpo. Em janeiro, ele afirmou que não adotaria novos tratamentos por conta da idade avançada. Viveu sob cuidados paliativos nos últimos meses e expressou o desejo de ser enterrado sob uma árvore ao lado de sua cadela Manuela.
"O câncer no esôfago está se espalhando para o fígado. Não consigo impedi-lo. Por quê? Porque sou um idoso e porque tenho duas doenças crônicas. Não posso nem fazer tratamento bioquímico nem cirurgia, porque meu corpo não aguenta”, declarou o ex-presidente em entrevista ao jornal Búsqueda.
Quando Mujica descobriu o tumor, a equipe médica disse que o câncer poderia ser controlado. Em novembro, ele passou por uma cirurgia e instalou um stent - equipamento utilizado para facilitar a ingestão de alimentos, situação que havia sido comprometida pelo câncer.
Lucía Topolansky, agora viúva do político, disse em entrevista à rádio uruguaia Sarandí que a situação se tratava de um “final anunciado” e que os médicos estavam fazendo de tudo para que ela se resolvesse da melhor forma. 
Da enxada às armas
José Alberto Mujica Cordano nasceu em 20 de maio de 1935, em Montevidéu, filho de pai basco e mãe italiana. De família agricultora, conviveu desde cedo com as agruras da vida rural e teve a mãe como o alicerce de sustento da família, já que seu pai faleceu quando o pequeno Pepe tinha apenas quatro anos.
Sua vida política começou como militante do Movimento de Libertação Nacional-Tupamaros, grupo guerrilheiro que lutou contra a ditadura militar uruguaia nas décadas de 1960 e 1970. Capturado em 1972, passou quase 13 anos na cadeia, muitos deles em condições desumanas e isolamento, experiência que moldou sua visão sobre a vida e a política.
Das armas à democracia
Com a redemocratização, Mujica foi liberto e anistiado em 1885. Ajudou a fundar o Movimento de Participação Popular (MPP), integrado à coalizão de esquerda Frente Ampla. Foi eleito deputado em 1995, senador em 2000 e ministro da Pecuária, Agricultura e Pesca entre 2005 e 2008, durante o governo de Tabaré Vázquez.
Em 2009, venceu as eleições presidenciais e governou o Uruguai entre 2010 e 2015. Seu mandato foi marcado por políticas progressistas tidas como pioneiras, como a legalização do aborto, do casamento igualitário e da produção e consumo de cannabis. Também promoveu o aumento do salário mínimo, a redução da pobreza e o acesso à moradia.
Os gastos públicos aumentaram, mas os índices de pobreza no país diminuíram de 18% a 9,7%. A taxa de desemprego ficou em torno de 7%.
Mujica teve uma relação bastante próxima com líderes de esquerda da América Latina, como a presidente da Argentina Cristina Kirchner e o presidente Lula. Recentemente, Lula entregou a Mujica a Ordem do Cruzeiro do Sul, mais alta condecoração oferecida pelo chefe de Estado brasileiro.
O mandatário deixou o governo em 2015, uma vez que não podia se candidatar a um segundo mandato consecutivo seguindo a Constituição do Uruguai. Depois da presidência voltou ao Senado. Em 2020, renunciou ao mandato citando a pandemia e sua saúde debilitada como motivos para sua decisão. Apesar disso, continuou ativo politicamente, apoiando candidaturas – como a de Orsi – e participando de debates públicos até seus últimos dias.
Vida simples
Mujica também ganhou reconhecimento internacional por recusar privilégios e viver um estilo de vida austero. Viveu a vida toda na mesma chácara e doava grande parte de seu salário presidencial a instituições de caridade, além de usar roupas simples e andar em um clássico Fusca azul. Ele foi casado com a também política Lucía Topolansky, que serviu como vice-presidente do Uruguai no segundo mandato de Tabaré Vasquez, e não deixa filhos.
Em 2014, os jornalistas Fernando Mitre, Ricardo Boechat e Fábio Pannunzio foram até a casa de Mujica para contar como as políticas dele colocaram o Uruguai nos noticiários para o Canal Livre.
Na entrevista, Mujica falou sobre as decisões descriminalizando a maconha, que na época gerou polêmica, e também comentou sobre a legalização do aborto e as marcas que a ditadura deixou no Uruguai.
“O ponto inicial é que tudo o que vínhamos fazendo não dava resultado. Cada vez havia mais consumidores. E sobretudo, muito pior que o consumo é o narcotráfico, que aumenta o grau de violência e corrupção que existe em várias esferas da sociedade”, disse o presidente na época. BAND / JORNALSANTANOTICIA
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